“Queimar as naves” é uma música feita de diferentes gestualidades que vão se desenvolvendo interativamente. Uma estrutura cuidadosamente desenhada (disposição de elementos, relações, processos) sustenta uma temporalidade deixada à escuta dos intérpretes: são estes – na relação sempre atual com seus instrumentos e os sons solicitados, com a estrutura musical e com os outros intérpretes – que decidem a cada passo os ritmos, as durações, as velocidades, os graus de mudança. O devenir da obra é um percurso possível desde uma situação ordenada e rígida até outra caótica e libertada à interação pura, passando por diferentes estádios intermediários. A superfície musical é articulada por várias desculpas. A principal: à medida que a obra avança, as duas guitarras vão desafinando pouco a pouco todas suas cordas até o limite do audível, o que permite o acesso a novas possibilidades sonoras abandonando as condições prévias; o retorno é materialmente impossível. Trata-se de decisões que determinam trajetórias irreversíveis. A obra exige uma escuta ativa e permanente, e uma execução solidária com o contexto; foi concebida especialmente para Nancy, grupo dedicado à improvisação livre.
Gonzalo Marhuenda, compositor da cidade de Córdoba, Argentina. É egresante da Licenciatura em Composição Musical da Faculdade de Artes da UNC, onde se formou com Juan Carlos Tolosa, Ana Gabriela Yaya, Gonzalo Biffarella, Franco Pellini e José Halac, entre outros. Trabalhou junto a intérpretes e grupos como Eduardo Spinelli, MEI flautas, Ensamble GEAM, o Coro Municipal de Córdoba e a Orquestra Sinfônica da UNC. Em 2021 recebeu o Prêmio Ibermúsicas de Composição e Estréia de Obra por “Queimar as naves”, em 2020 o primeiro prêmio do Concurso Federal de Composição por “O Desejo como Processo”, e em 2019 o terceiro prêmio do Concurso de Composição de Miniaturas para Flautas por “Diálogo de castelos de cartas”. É coordenador de Lontano, coletivo de criação musical. Além disso, é arranjador da Orquestra Ocasional de Rock Sinfônico e guitarrista da banda Asterion.
Nancy é formada inicialmente como uma dupla de guitarras elétricas em 2008 e atualmente funciona como um trio com a incorporação de um clarinete baixo. Sua música se caracteriza por ser improvisações ruidísticas instrumentais. A mistura do som elétrico dos acoplamentos e a fricção percutida das guitarras sobre diversas matérias com o som acústico do clarinete. Não se fixam premissas. De antemão já está acordado tacitamente o que não vai acontecer em cada sessão, não haverá canção, não se repetirão melodias, não soará nenhum acorde cromático, não se sabe quando vai terminar cada momento da sessão, a intensidade ocorre de imprevisto e quanto dura esta depende de como se vá manifestando a mesma. As sessões assemelham-se de alguma forma a um rito, a uma dança ou a um exorcismo.
● Quinta-feira 17 de março, 21:00 hs. em Casa Camaleón – Irmão Damasceno 1964, Montevideo, Uruguai